Rações “Grain Free” e cardiopatia em cães

Dentre as várias tendências que estamos observando no segmento da alimentação de cães, surge o aumento da oferta de rações denominadas “Grain Free”, ou seja, produtos formulados sem a presença de grãos, um dos importantes ingredientes das dietas tradicionais.

Motivados por relatos de problemas com estas dietas, Kaplan et al  publicaram em dezembro de 2018 um artigo em que estudaram mais profundamente a possível ocorrência de Cardiomiopatia Dilatada em Golden Retrievers.

O que é a Cardiomiopatia Dilatada?

A Cardiomiopatia Dilatada (DCM) em cães é caracterizada por dilatação ventricular, disfunção sistólica e arritmias que podem culminar em insuficiência cardíaca e morte. É a segunda cardiopatia mais frequente em cães, acometendo principalmente animais de grande porte e machos. 

A etiologia é idiopática, mas alguns genes associados à doença já foram identificados. A manifestação clínica é dividida basicamente em estágios oculto e sintomático. 

O estágio oculto é caracterizado pela presença de alterações elétricas e/ou morfológicas e ausência de sinais clínicos. Os cães podem apresentar o estágio oculto longo até o desenvolvimento de insuficiência cardíaca de forma aguda ou morte súbita. 

O estágio sintomático é definido pela presença de insuficiência cardíaca esquerda ou biventricular. O diagnóstico somente é confirmado por meio de ecocardiograma e/ou Holter. Estes exames são considerados padrão-ouro, uma vez que apresentam alta sensibilidade na identificação precoce da doença.

Cães de raças predispostas (como o Golden Retriever, Cavalier e Cocker Spaniel, entre outros) devem ser monitorados anualmente a partir dos três anos de idade. O tratamento tem o intuito de minimizar os efeitos da insuficiência cardíaca, sendo instituído de acordo com a fase em que o animal se encontra. O prognóstico após início dos sinais clínicos é desfavorável. Alguns fatores podem influenciar a sobrevida de forma positiva ou negativa. A realização de exames periódicos é de grande importância para obter o diagnóstico precoce e intervir de maneira a retardar a progressão da doença.

A pesquisa propriamente dita e seus resultados.

Kaplan et al conduziram um estudo observacional multicêntrico com vinte e quatro golden retrievers de pacientes com deficiência de taurina documentada e cardiomiopatia dilatada e 52 Golden Retrievers saudáveis.

A primeira observação que fizeram no grupo dos animais com deficiência de taurina e Cardiomiopatia Dilatada é que eles foram alimentados com dietas isentas de grãos e ricas em leguminosas ou uma combinação desses fatores. Nenhuma dessas dietas foi testada segundo os procedimentos estabelecidos pela Association of American Feed Control Officials (AAFCO). 

Vinte e três dos 24 cães tiveram melhora significativa em seus parâmetros ecocardiográficos e normalização das concentrações de taurina após mudança de dieta e suplementação de taurina. Nove dos 11 cães diagnosticados com Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC) tiveram resolução de sua congestão no acompanhamento, com cinco não necessitando mais de terapia diurética e quatro tolerando a redução da dose de diurético em acima de 50%.

Conclusões:

Certas dietas e suas características foram associadas ao desenvolvimento de deficiência de taurina, um aminoácido que geralmente é alcançado sem a necessidade de suplementação nas dietas tradicionais. A deficiência de taurina e a Cardiomiopatia Dilatada em Golden Retrievers provavelmente são multifatoriais, incluindo uma combinação de fatores dietéticos, metabólicos e genéticos.

Ao aprofundarmos a pesquisa do tema dietas “Grain Free” constatamos que outras raças desenvolvem patologia similar, como é o caso do Cocker Spaniel e Cavalier. Isto pode sugerir que a lista de raças afetadas não se limite às que até agora apresentamos e devem incluir inclusive os SRDs.

Ressalta-se que a atuação de veterinários especialistas em clínica e nutrição canina se faz necessário para suprir a falta de indicação de suplementação de taurina para certas raças puras e SRDs e animais com alterações metabólicas e genéticas. Todas elas não indicadas nas tabelas de recomendação nutricional da AAFCO, FEDIAF e NRC. 

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